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sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Posição de náufrago


     Era a terceira vez que chamava o nome dela e enquanto batia impaciente a moeda no balcão de acrílico senti alguém se aproximar.

     - Doces mais uma vez? Isso não me parece uma boa ideia. - Olhei para o lado seguindo a voz. Meu olho estava encolhido pelo sol. Fora a visão de um perfil lindo que observava as guloseimas na prateleira. Voltei para a moeda em minha mão preocupada. “Feito, um garoto bonito que agora acha que você esqueceu os óculos de grau em casa” pensei. “Não irei me atrever a virar novamente”.

     - Acho que não há ninguém, não é? – Disse olhando para mim. Virei-me e respondi.

     - Tem sim, ela só é um pouco desligada, vive perdendo clientes por isso. – Ele riu, fora um sorriso tão brilhante quanto seus olhos, e eu havia de ter certeza que não foi o sol ou minha fascinação que o iluminava. Algo puxou sua camisa.

     - Vai demorar de mais Miguel? Quero meus doces. – Reclamou a criança ao seu lado que logo se emburrou na parede sem respostas. Eu ri.

     - É seu irmão? – Perguntei mesmo um pouco pasma com minha coragem. Miguel sorriu e se virou ao pequeno. – Não, esse guloso é apenas meu primo!

     O silêncio então chegou, peguei o celular para ver as horas, o tempo em que eu iria estender para continuar ali, sem jeito, porém querendo ficar.

     - The walking dead? – Perguntou apontando para meu papel de parede. Olhei, e mesmo que talvez perdida em seus olhos azuis respondi:

     - Sim! – sorri. – Bom gosto! – Ele retrucou.

     - Obrigada, digo o mesmo a você. – disse.

    - Ouvi alguém me chamar?! – Era Cida, a dona da bomboniere que me fez sonhada por uma sequencia impercebível de minutos. Pedi o meu sorvete sabor chocolate e ele as tantas balas e chicletes que seu primo desejara. Dei minha moeda e sai.

     - Até mais... – ele pausou e colocou a mão na testa – Manuela! Até Miguel! – Completei enquanto ele acenava.

     Naquela noite pensei em todas as possibilidades de encontra-lo de novo, relembrei por mais dez vezes aquelas palavras que talvez pudesse chamar de diálogo, imaginei como ficaríamos juntos. Coisa de louca, coisa do coração. Nunca mais o vi, nem em ruas ou em paralelas de redes sociais. Bem mais tarde, após noites esquecendo e segundos relembrando, percebi que cairá em um truque da vivencia. A partir do naufrágio do menino sorridente, cada olhar bonito que passava por mim entre placas, lojas, balcões me fazia segurar entre pensamentos a tentação da ilusão, a fim de conseguir um amor verdadeiro. Bobagem. Essa paixão que a gente sonha, a qual trará dias sofridos, meses felizes, não vêm com receita, superstição, regrinhas de revistas, apenas com ordens, ordens do amor, esse sentimento que é o que é e ponto, seja esperado, ou inesperado. Lotado de exceções, vazio de restrições, ora náufraga quem é errado e quem achamos que é certo."Náufraga até mesmo os pretendentes com nomes de anjos” – Pensei alto. 

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